9 de novembro de 2008

Cacos de um Mosaico

“Eu vi um menino correndo, eu vi o tempo,

brincando ao redor do caminho daquele menino...
... O tempo não pára e no entanto ele nunca envelhece”

(Caetano Veloso)


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Certa feita li, não me lembro onde e nem por quem foi citado, que “a felicidade é como o vento: sopra onde quer, não se sabe de onde vem nem para onde vai"... Acordar pensando nisto, mesmo que alheio a nossa vontade é no mínimo sintomático. A sensação parecia a mesma de quem estava em um verdadeiro turbilhão, vivendo sua metamorfose.. Balancei a cabeça com acentuada velocidade, por várias vezes, e pensei: trocaram meu software!

A propósito, você sabe o que é software? É uma palavra inglesa que indica o programa, a lógica com que o computador trabalha; e este “meu”, de carne osso e sujeito à intervenções do meio, costuma ser movido por um software que só conhece a lógica da soma. Somo o tempo todo, não jogo nada fora, costumo não me esquecer de nada: somo vivências, experiências, os amigos, os anos, e levo tudo pra minha caixa de ferramentas, afinal, a memória é um jeito prático de somar. São duas razões que me levam a ajuntar: o Amor, guardo porque amo; e a Busca constante, porque me faz sentir viva e traz satisfação. Porém, quando só o sentimento aflora no primeiro minuto do dia me vem a sensação de que o software foi trocado de soma por subtração, ou então, quem sabe, foi infectado por algum poderoso vírus, que acionado, deixa a sensação de vazio.

Volto-me então, ao “computador máquina”, tentando expressar através da linguagem escrita um pouco dessa sensação.. Sentia-me um pouco triste, talvez saudosa, típica sensação que perdura, nada mais nada menos do que o tempo de questioná-la e entende-la.. mas aí me vem à mente uma citação de Guimarães Rosa: “felicidade só em raros momentos de distração”. Será? Não creio não, e me reservo o direito, com respeito, de discordar deste grande escritor e romancista, porque de acordo com a minha verdade.. "a felicidade depende em muito de nós mesmos", de como entendemos nossos momentos, de como trabalhamos nossos sentimentos, de como validamos as pessoas que nos rodeiam e os fatos que nos marcam.
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Existem pessoas que fazem opção por uma vida de lamentações e sofrimentos, que se esquecem de viver as coisas mais simples e gostosas, perdendo assim os bons momentos e não usufruindo naturalmente das companhias que vão cruzando seu caminho. Ao sentirmos, por vezes, a presença de algum vírus em “nossas máquinas” (seja a da razão ou emoção), faz parte da vida detectar tais interferências com um misto de saudade e de lembrança porque só pode valer-se deste sentimento aquele que já o viveu e tem histórias para contar. Sentir saudades ou ter lembranças, não é algo negativo, muito pelo contrário, porque nos faz mais humanos, nos faz pontualizar quem somos e quem são as pessoas que vivem à nossa volta.

Pensei um pouco... refleti sobre tudo o que me inquietava e imaginando mudar o “programa” percebi que “pobre” seria apertar a tecla “delete” sem entender o que acontece. Então, fui fuçar no fundo de minha caixa de recordações porque todo sentimento é a soma do resultado de nossas ações. Porém, maturá-los, somente se torna possível, aceitando-os e vivendo-os como eles se apresentam: plantio, cultivo e este florescer. Sentir saudades, embalar lembranças, ficar triste pela ausência de pessoas queridas faz parte da vida. Ruim mesmo seria nada sentir, nada ter a recordar, nada ter construído porque nenhum sentimento é mais importante do que a alegria e satisfação de estar vivo, 'permitir cortar-se e voltar sempre inteira', teclar o "play", executar programas diferentes e de acordo com o anseio dos anos: eis a maior prova de que vale à pena sentir e viver o pulsar da vida.

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Como diz o inigualável Rubem Alves em uma de suas obras: “a alegria de ver a conquista do jardim plantado é indescritível. A espera foi grande porque jardins precisam de terra para existir, e terra eu não tinha. De meu mesmo, só tinha o sonho; e sei que é nos sonhos que os jardins existem bem antes de existirem do lado de fora. Um jardim é um sonho que virou realidade, revelação de nossa verdade interior escondida, nossa alma nua se oferecendo ao deleite dos outros, sem vergonha alguma... Mas os sonhos, sendo coisas belas, são coisas fracas porque sozinhos eles nada podem fazer: pássaros sem asas... Sim, são como as canções que nada são até que alguém as cante; como sementes dentro de pacotinhos à espera de alguém que as liberte e as plante na terra. Os sonhos viviam dentro de mim, eram posse minha, mas a terra não me pertencia.. Precisei conquistá-la e cultivá-la, para florescer”.

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Conquistar e cultivar requer, acima de tudo, muito trabalho. E o sofrimento bem como o sentimento de vazio surgidos muitas vezes durante o percurso são fatores integrantes da espera pela colheita. A vida está para nós como cacos de um grande mosaico à espera de cada artista que existe em nosso interior: quem faz a leitura correta de seu caminho, junta estes cacos sempre que necessário, segundo exige seu coração. Os mosaicos podem ser bonitos ou feios, mas dependem do coração do artista. Como disse JESUS: “O homem bom tira coisas boas do seu bom tesouro; o homem mau tira coisas más do seu mau tesouro”. Coração mau faz mosaico feio; coração bom, faz mosaico bonito. Simples? E assim é a vida...

Outra semana se inicia, tarefas novas me aguardam; se a sensação de mudança no meu software persistir, com certeza será por outros tantos motivos, por outras novidades que se apresentarão, e assim eu vou.. plantando meu jardim...

E você, como sentiu sua máquina hoje? O software teve interferências de vírus? Seu jardim já foi plantado? Seu mosaico está colorido? Lembrem-se: "Quando o coração arde sem um ferimento é porque o corpo sangra sem uma gota de sangue".

Boa semana a todos (as)!

 
©2007 '' Por Elke di Barros